Uma
decisão do prefeito de Jijoca de Jericoacoara, Leandro Cézar (PP), gerou
intensa controvérsia e voltou os olhares do Ceará para a Vila de Jericoacoara,
a joia do turismo cearense e uma das praias mais visitadas do Brasil. O
prefeito nomeou Andrea Vale Spazzafumo para o cargo de superintendente da
Autarquia de Desenvolvimento do Turismo, Mobilidade e Qualidade de Vida de
Jericoacoara (ADEJERI).
O
órgão municipal foi criado para ser o principal operador e fiscalizador do
desenvolvimento sustentável da Vila, inclusive gerindo o Fundo de
Desenvolvimento Turístico de Jeri, abastecido pelo pagamento da taxa de turismo
sustentável que todos os visitantes precisam pagar para permanecer na área.
A
principal controvérsia na nomeação está no fato de que Andrea Vale Spazzafumo é
administradora e ligada a diversas empresas do setor hoteleiro e restaurantes
na região de Jericoacoara, incluindo o badalado Hotel Essenza, cujas diárias
saem em média por R$ 2 mil na baixa estação.
Nome
ligada a processos e investigações
O
nome da empresária, conforme documentos recebidos por esta Coluna, está
diretamente ligado a empreendimentos que estiveram sob investigação e ações
judiciais movidas pelo Ministério Público Federal (MPF). As denúncias incluem
alegações de invasão e privatização de área pública (faixa de praia) e crimes
ambientais. As ações só foram encerradas após um acordo em que os réus pagaram
multas e tiveram que desobstruir as áreas ocupadas ilegalmente.
A
escolha para a superintendência da ADEJERI, um órgão municipal de extrema
relevância para o turismo e desenvolvimento, é vista com grave preocupação por
segmentos ambientais e comunitários da região.
O
Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE), inclusive, recebeu denúncias que
classificam a nomeação como uma “ironia” e uma “grande surpresa”, especialmente
considerando que o MPF apontou a administradora como “peça central” e com
“protagonismo nos ilícitos” relacionados às invasões e irregularidades na Vila.
Poder
público deu “superpoderes” à ADEJERI
A
gestão de Jijoca de Jericoacoara, sob comando do prefeito Leandro Cezar (PP),
iniciou o mandato com mudanças estruturais aceleradas na Vila, ampliando os
poderes da Autarquia de Desenvolvimento do Turismo (ADEJERI) e propondo a
regularização de construções irregulares.
As
medidas ocorreram em meio à nomeação de Andrea Vale Spazzafumo, ligada a vários
hotéis e empreendimentos na região e que, anos atrás, havia sido alvo de
investigações do Ministério Público.
Com
os projetos aprovados pela Câmara Municipal, a ADEJERI passou a ter mais
autonomia e acesso direto a um robusto caixa financeiro com 30% da Taxa de
Turismo Sustentável, além de protagonismo na gestão urbana e turística da Vila.
A
coincidência entre o empoderamento do órgão e a criação de um mecanismo legal
para regularizar obras fora da lei levanta ainda mais suspeita de possível
favorecimento a interesses privados.
Superintendente
nega conflito de interesse e irregularidade
Em
entrevista a esta Coluna, Andrea Vale Spazzafumo confirma ser administradora de
grandes empresas de hotelaria em Jeri, mas nega que faça parte da gestão direta
dos empreendimentos como o Hotel Essenza.
Ela
nega quaisquer irregularidades nas ações judiciais que foram encerradas “sem
culpabilidade” para ela e as empresas. A representante rechaça ainda a
possibilidade de “conflito de interesse” entre a representação das empresas com
interesse direto na gestão de Jericoacoara e a Superintendência da Autarquia,
órgão público com poder de fiscalização.
Andrea
argumenta que a atual gestão não atua em favorecimento “a ninguém” e que, no
comando da Autarquia, ela não tem poder “de dar isenção fiscal” e nem
"nada que favoreça” a qualquer empresa.
Em
relação aos processos judiciais contra ela e as empresas, Andrea acrescenta que
foram extintos sem punibilidade, informação reforçada pelo advogado dela João
Marcelo Pedrosa, que também falou com esta Coluna. Andrea nega as alegações do
Ministério Público Federal, de suposta invasão de terras públicas e possíveis
crimes ambientais.
Segundo
ela, o acordo feito nas ações foi uma estratégia jurídica para pôr fim aos
processos, a pedido dos sócios das empresas, e não um "reconhecimento de
culpa". “Quero reforçar que sempre fizemos tudo dentro da lei". A
advogada enfatizou ainda que atua na região de Jeri desde 1993 e já participou
da defesa das comunidades locais e também de grandes empreendimentos.
Turbulências
no paraíso
O
badalado destino turístico vem enfrentando sucessivos problemas. Em janeiro de
2024, uma empresa privada venceu a concessão dos serviços do Parque Nacional de
Jericoacoara após um leilão realizado pelo Governo Federal no valor de R$ 61
milhões. Uma das medidas previstas seria a cobrança de uma nova taxa para
acesso ao parque.
Após
forte repercussão negativa, a Justiça Federal suspendeu a possibilidade de
cobrança e estabeleceu prazo para que o ICMBio e a empresa apresentem um
programa detalhado de custos e critérios de isenção.
(Diário
do Nordeste)